sexta-feira, 27 de julho de 2012

Férias com a família, ou sem ela.


                Família é um festival de incompreensões. Valores morais sem sentido, rupturas e prisões. Tentamos, acima de tudo, nos relacionar. Com todas essas humanidadesinhas cotidianas que insistem em não ter cabimento. Até que chega a hora da ruptura, que bem pode ser compreendida como mais incompreensão. Mas como assim você irá abandonar sua família? Eu não abandonei. Sei de cada fato que acontece, sei das reformas, das brigas, das flores se abrindo e da dança dos famosos. Eu só não suporto conviver com tudo isso. Acredito que cada um deva ter o direito de escolher com o que suporta ou não viver.
                Há tanta melancolia no olhar da minha mãe, mesmo quando ela fala da felicidade absoluta na qual ela acredita vez ou outra viver. Trata-se de uma sonhadora, ela não suporta a realidade. Uma artista que driblou a vida e desenhou sua história com muito trabalho. Entretanto, eu não suporto a forma como ela trata quem trabalha para ela, nem ao que ela está submetida. Sinto asco por status social e toda a corja política que a humilhou durante todos esses anos.
                Confesso que é bem cômodo pensar que tenho um pequeno abrigo, caso meu frágil emprego assalariado dê errado. Preciso me livrar desse pensamento para poder libertar minha mãe. É difícil entender tudo isso. Pior ainda é ser o fio que une a família. É muito pesado tá no meio desse chumbo trocado, ainda mais se for de cara.
                Vim passar as férias no nordeste por saudades de várias coisas e pessoas. Me surpreendi com meu irmão, ele está bem melhor do que eu esperava. Consegui até passar 48h sem sentir ódio dele. Um feito.  O buraco é mais em baixo com minha mãe. Ela trabalha de uma forma alucinada pra manter um pesadelo que até hoje não teve fim. Eu não posso fazer nada. Vejo a morte se aproximar dela e não posso dar vida. É frustrante, porque eu tenho um trabalho que dá vida às pessoas, que demonstra outras formas de viver. Eu não consigo fazer isso com a minha mãe. Então eu me pergunto se a família estivesse junta, se seria diferente, a verdade é que não nos suportamos. Nos amamos e não nos suportamos. Essa é a realidade. É o real fim da família, da propriedade privada invadida pelos políticos que odeiam minha mãe e do Estado. O problema é que a classe vitoriosa é a burguesia. Por pouco tempo.

domingo, 22 de julho de 2012

Como fazer para viver num mundo repleto de dúvidas?


Nossa geração cresceu cheia de dúvidas que hoje se transformam em dívidas. As parcelas de cada mês nos proporcionam pequenas brechas de prazer, ou daquilo que é vendido como prazer. O cartão de crédito é um forte aliado contra o mundo, um grande companheiro. Não só "temos", como propagandeamos que "temos" nas redes sociais, numa tentativa de prolongar o gozo do possuir. Mas as parcelas sempre são mais longas que aqueles instantes de felicidade. Conhecemos mais coisas, lugares, notícias e pessoas. Ao mesmo tempo não conhecemos nós mesmos, e o tempo fica cada vez mais raro para o árduo ofício de se conhecer.
Caro leitor, não pense que este texto é um alarde pessimista. Trata-se de uma constatação, estamos assim com tudo que há de bom e ruim junto. Temos acordo sobre a urgência imediata de viver confortavelmente, viajar e ver novidades. Sem isso a vida desbota, afinal precisamos vê o fruto do nosso trabalho e ser feliz com ele. Contudo o problema se localiza exatamente na nossa vida privada que vem nos privando das nossas próprias dúvidas acerca do mundo.
Exemplifiquemos com os dilemas que são de ordem prática, do tipo como eu posso ter tantas coisas sem um real aumento salarial que cubra a inflação? Quanto tempo da minha vida eu dedico a trabalhar para sustentar os juros do banco? Estas perguntas podem até surgir, mas não há tempo nem condições de bancar as respostas. Assim, chegamos a mais uma reflexão sobre as dúvidas: nem sempre conseguimos solucioná-las. É o império do medo da incapacidade traduzido "no deixa pra lá".
Apesar de ser o último parágrafo e haja uma necessidade de desfecho, não há muita solução para os dilemas nossa geração, sejam as dívidas ou as dúvidas. Aliás, não há nada acabado. Quem sabe as próximas gerações nos superem em suas elaborações sobre a vida, unindo os pedaços de pensamentos e fatos que insistimos em separar por medo de ousar sair da nossa frágil vida privada. Ou poderemos de alguma forma comprar as dúvidas de alguém

domingo, 1 de julho de 2012

             Algumas lições   


           Possuo algumas discografias, algumas fotos (talvez umas importantes demais pra mim outras nem tanto), um colchão de casal usado por outras pessoas além de mim assim como a minha mesa na cozinha. Possuo um armário com mais roupas que eu posso usar e talvez menos do que eu precisava em momentos especiais (sempre uso roupas novas de forma desnecessária). Acabo de comprar um dos melhores doces de leite do mundo e uma colher dele já é o suficiente pro meu cérebro gozar. Possuo também uma bi - cama que fica na sala servindo de sofá e abrigo para as visitas. Não recebo muitas visitas, o que é bom por vários aspectos e ruim pelo o principal aspecto: me sinto só. Bela porcaria, milhões e milhões de pessoas se sentem assim e fazem coisas como ir a festas, praia, cursos... eu bem sei a solução do meu problema, mas acho que não estou disposta a fazer nada disso, não por agora. Me sinto como se fosse uma cidade cheia de escombros precisando ser reconstruída, ou talvez minha metáfora esteja errada e eu precise erguer algo neste deserto.
                Acho que o primeiro garoto que eu gostei foi aos 6 anos, eu queria ser a adulta, ele nem me dava bola e eu tremia ao sentar do lado dele. Acho que eu tremia com a possibilidade dele me aceitar como eu sou. Nesta época eu ainda nem tinha conhecido meu pai. Deve ter sido a primeira rejeição da minha vida. A segunda foi a visita do meu pai. Não sei se foi pior conhecê-lo e perde-lo do que não ter conhecido. Eu gostava dos meninos da escola, aliás eu gostava de gostar deles. Me sentia diferente por escrever poemas. Sempre fui muito boa em inventar histórias, tão boa que eu mesma caia nelas, e eu sofria de verdade. O primeiro homem que eu gostei tinha 16 anos, e eu 12. Eu fiz um roteiro de filme na minha cabeça que nem eu mesma sei qual é a verdade. Ficou a versão mais bonita. Eu pintando ele entrou na aula com seus cabelos longos e negros, sua boca carnuda, e na época a Sandy gostada do Lucas da família Lima, portanto eu gostava de homens cabeludos. O pincel tremia na minha mão e no dia seguinte eu podia contar a história fantástica na escola, virando assim motivo de fofoca por gostar de um cara mais velho. Me interessei, beijei outros meninos, mas ele era minha história oficial. Tantos encontros e desencontros e eu nunca vivi nada real com ele. Eu gostava de mim e da fantasia que a minha cabeça conseguia criar. Num cenário pobre que é a atualidade, minha fantasia era igualmente pobre, mas me causava algum frisson.
                A grande questão é como se faz pra gostar de alguém e não de si mesmo. Acho que desprezo tanto a mim, que imaginar o amor nos outros é entrar em mania. Eu me amo tão pouco que me desperdiçar em troca de alguma aceitabilidade se tornou um vício. Me distanciei da possibilidade de amar/apaixonar. Sinto-me no limite entre amor próprio e orgulho. Ainda não sei mediar bem as coisas. Esta cidade e seus escombros, ou este deserto e suas tempestades não são fáceis de lidar. Ninguém falou que seria.